A artista e produtora cultural Tainá Santos, de 25 anos, tomou posse como presidenta do Conselho Estadual de Cultura da Bahia na última sexta-feira (4), em cerimônia realizada na sede do órgão, no bairro do Canela, em Salvador. Eleita em 30 de maio, junto ao vice-presidente Pedro Son, Tainá representa a nova geração de agentes culturais que ocupa o colegiado com o compromisso de renovar, democratizar e ressignificar os espaços institucionais da cultura no estado.

Conhecida também pelos nomes artísticos MAIT e Kaolin, Tainá é a terceira mulher a ocupar a presidência do Conselho Estadual de Cultura. Antes dela, Eulâmpia Santana Reiber (2005-2006) e Pam Batista (2019-2021) abriram caminhos. Nascida e criada na zona rural de São Miguel das Matas, no Vale do Jiquiriçá, sua trajetória é marcada pela potência da cultura de base e pela luta constante por representatividade e visibilidade. “Vim da cultura de base, do hip hop. Represento o Recôncavo, mas sou do interior, da zona rural”, conta.

Na adolescência, após o diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e Transtorno do Espectro Autista (TEA), Tainá começou a transformar o conteúdo escolar em poemas para facilitar o próprio entendimento. Por meio da poesia, se aproximou do hip hop: “Fui apresentada aos grupos Racionais MC’s, Facção Central e a artistas como Dexter. O rap me deu linguagem”, recorda.

Aos poucos, o que começou como estratégia de sobrevivência e aprendizagem virou ferramenta de transformação. Em 2018, passou a organizar batalhas de rap e eventos culturais, muitas vezes com recursos próprios. “Sempre organizei batalhas, levava a galera, articulava tudo. Fazia porque sabia que era necessário. Quando me dei conta, já estava fazendo parte da cena”.

Estudante de História na UNEB (campus V), em Santo Antônio de Jesus, onde vive desde 2018, Tainá também é Abiã de Candomblé, artista da 7KMob, assessora de artistas e produtora da Gangcity e da Rede RUA. Suas áreas de interesse são as questões de gênero, capoeira e a invisibilidade das mulheres nas batalhas de rima do Recôncavo. Na prática, seu ativismo cultural é marcado pela escuta, pela ação direta e pela defesa de políticas públicas inclusivas e plurais.

“A minha chegada ao Conselho é sobre quebrar paradigmas. Sou uma mulher preta, bissexual, do Candomblé, da zona rural, com TDAH e TEA. Represento um monte do que incomoda a sociedade”, assinalou.

Para o secretário estadual de Cultura da Bahia, Bruno Monteiro, a posse da nova mesa diretora reflete o atual momento da gestão cultural no estado, marcado pela democratização do acesso à cultura. "A experiência de Pedro Son somada à renovação representada por Tainá representam comprometimento com pautas históricas concomitante com os desafios do atual momento das políticas culturais na Bahia. Uma presidenta jovem, negra, do interior, neurodivergente, LGBTQIAPN+ e representante da cultura popular simboliza a conexão do Conselho com sua missão de ser um colegiado sintonizado com as lutas sociais e culturais contemporâneas”, afirmou.

OCUPAÇÃO – Tainá conheceu o Conselho de Cultura durante um evento de hip hop em Salvador, onde participou como jurada de batalha de rappers. “Antes disso, eu sabia que o Conselho existia, mas era uma ideia distante, inacessível. Nunca imaginei que pudesse ocupar esse espaço”, recorda.

Incentivada por colegas da Rede RUA, passou a participar das discussões e se candidatou como conselheira, representando o território de identidade do Recôncavo. Com a posse, ela se torna também símbolo da renovação do colegiado. “Eu e Pedro fomos eleitos pela sociedade civil. Fui eleita por pessoas que acreditam em mim, que acreditam no que a gente pode fazer. Estou muito bem acompanhada pelo meu vice, que vem da cultura popular e traz uma bagagem imensa”, ressaltou.

Pedro Son, eleito vice-presidente do Conselho, destaca o desafio e a importância dessa nova fase: “O Conselho ainda é visto como um espaço fechado, inacessível. Agora, com jovens e lideranças como Tainá, temos a chance de virar essa chave. A gente vem com outra mentalidade, com mais escuta, transparência e ação”.

Para Tainá, essa mudança começa pela comunicação e pela presença. “Sou neta de costureira, bisneta de lavrador, filha da roça. Toda a minha família tirou o sustento da terra. Somente meu tio completou o ensino superior e agora está no doutorado. Venho desse lugar, mas não estou sozinha. Trago comigo um território, história e luta. Represento todos que achavam que esse lugar não era para eles”, conclui.

SOBRE O CONSELHO - O Conselho Estadual de Cultura da Bahia (CEC) é um órgão colegiado do Sistema Estadual de Cultura. Criado em 1967, tem como finalidade contribuir na formulação da política estadual de cultura. Seguindo os parâmetros da Lei Orgânica da Cultura (12.365/11), o órgão é composto, atualmente, por 30 conselheiros e conselheiras, todos com seus respectivos suplentes. Dois terços dos integrantes foram eleitos como representantes dos territórios de identidade cultural e dos segmentos e fazeres culturais. Os demais são membros indicados pelo poder público. O CEC é o primeiro conselho no Brasil a inserir em seu quadro agentes culturais da sociedade civil escolhidos após processo eleitoral.